terça-feira, 24 de maio de 2011

Da história para a fofoca...

Alguns dos meus bons amigos de faculdade eram do curso de geografia. Como eles tinham o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) acabei assistindo a muitas apresentações e comentários de professores. Um deles era famoso por ganhar a plateia de geógrafos fazendo piada com historiadores, e disse certa vez:

"História é fofoca com método."
Digamos que ele não está certo, mas também não estava completamente errado. Método, ou seja, o caminho investigativo segundo regras científicas (tese + antítese = síntese / rigor na análise, precisão das fontes, etc.) faz parte do trabalho do historiador como de qualquer outro cientista. E o fato de muitas vezes termos acesso a fontes que não são lidas comumente acaba nos transformando em bisbilhoteiros profissionais.
Imagine o que se pode encontrar lendo a correspondência pessoal de indivíduos que hoje são conhecidos como grandes artistas, políticos ou "herois". Torana-se comum tropeçar em casos de amantes, filhos bastardos, relações suspeitas, escândalos, apelidos, etc. E como as pessoas gostam da vida alheia, não é?
Não vou dizer que sou contra as "curiosidades históricas", mas é bom lembrar que elas, por si só, adiantam pouca coisa. Porém, podem servir de ponto de partida.
Vejamos um post do blog Superlistas, da Superinteressante: 7  reis com apelidos bizarros.
A pergunta por trás deste texto (bem divertido, aliás) poderia ser: qual a função dos nomes (ou sobrenomes) e como eles se estabelecem?
Apesar do uso corrente no Brasil, "nome" na verdade é  o prenome, ou seja, o nome individual, "de batismo". No entanto, em sociedades muito pequenas, rurais ou em cidades pré-industriais, o individual pouco importava. Durante a Idade Média e mesmo a Idade Moderna, era fundamental a sua rede social: qual sua família, clã, cidade ou região de origem, qual era a atividade dos seus. E daí vinha seu "nome", aquilo que designava quem você "realmente" era. Em uma sociedade anterior ao individualismo burguês (algo surgido mais ou menos a partir do século XVIII, mas consolidado como parte de uma mentalidade só no século seguinte) o importante não era saber que eu sou, e sim saber o que dizem as ligações com a comunidade da qual faço parte.
Poderíamos imaginar o seguinte diálogo em algum ponto de Portugal:
- Sabe o Manuel?
- Qual Manuel?
- O filho do Álvaro.
Logo, tratava-se de Manuel Álvares. Assim como em inglês temos o sufixo "-son", em dinamarquês o "-sen", em espanhol "-ez", o filho é designado em português pela terminação "-es": Esteves, Rodrigues, Fernandes, etc.
Ainda podemos pensar diferente:
- Sabe o Manuel?
- Aquele nascido em Braga?
Logo, trata-se de Manuel Braga. O nome da cidade acaba virando um "atestado": Braga, Moreira, Coimbra, Prado, etc.
Em outros idiomas ainda temos a ideia da profissão e é fundamental lembrarmos que os ofícios em época sem a disseminação de escolas era passado de pai para filho ou como parte de uma corporação tradicional. Portanto, John Miller, nada mais era (no passado) que João, o moleiro, aquele que possuía um moinho (mill = moinho). Em alemão, por exemplo, temos como nome de família profissões como açougueiro, alfaiate, ferreiro, carpinteiro, entre tantos outros. 
Com o tempo perdemos um pouco a noção do significado, afinal, os idiomas foram se modificando e o nome se banalizou. Atualmente, não há como encontrar alguém em cidades com milhares de pessoas sem o uso de um nome formal. Apesar que em alguns círculos menores os apelidos e referências familiares ainda são mais usuais. Na escola, por exemplo, alguns alunos se referem a colegas usando apelidos que fazem total sentido para eles, mas para mim pouco dizem...

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