segunda-feira, 30 de maio de 2011

Piratas: sujos, maus e adoráveis

Lembro-me exatamente desta capa
Há uma semana fui ao cinema assistir ao novo filme da franquia "Piratas do Caribe". Não estava muito disposto a pensar, queria uma diversão simples e adoro o Johnny Depp em qualquer filme. Dentro destes quesistos "Piratas do Caribe" é sucesso garantido, uma fórmula que não falha. Mas tem um outro elemento importante, as histórias de piratas sempre dão certo: mocinhos e bandidos, lugares exóticos, espaço para algum romance, aventuras e tesouros. Quando criança me encantei com "A ilha do tesouro", escrito por Robert Louis Stevenson.
Este livro de Stevenson é um clássico e um livro "fundador". Escrito em 1883 coloca no mesmo barco (literal e metaforicamente) um garoto e piratas. Além disso, "inventa" para a literatura o esteriótipo do pirata com tapa-olho, gancho, perna de pau, papagaio, etc, e o mapa do tesouro com um X no local a ser cavado. Porém, já para Stevenson a pirataria era algo distante, pois seu ápice foi na Idade Moderna, entre os séculos XVI e XVII e, especialmente, na região da América Central.
A pirataria marítima é algo consideravelmente antigo. Se a definirmos como saque ou pilhagem de embarcações e cidades por navios fora do contexto de uma guerra entre países e com o único objetivo de enriquecimento rápido, poderemos ver a pirataria praticada pelos gregos, fenícios e romanos no Mar Mediterrâneo, durante a Antiguidade. Depois, durante a Idade Média, teremos piratas muçulmanos na mesma região, assim como tivemos indianos e chineses no Oceano Índico.
Na verdade, a pirataria não depende muito da época ou do local. Fundamental é a existência de rotas comerciais extremamente lucrativas e uma brecha que permita a existência de um mercado paralelo, clandestino.
Com a descoberta da América e a colonização do continente, especialmente pelos espanhóis, mas depois também por ingleses, franceses e holandeses (região do Caribe e Antilhas), o fluxo comercial para a Europa era enorme. Em plena lógica mercantilista, o esforço da colonização tinha como intuito enriquecer as metrópoles, de modo que os produtos (com destaque para os metais preciosos) e os impostos deveriam ser remetidos para o outro lado do Atlântico. Do mesmo modo, seguindo o entendimento segundo o qual o entesouramento de metais preciosos, conhecido por metalismo, era a melhor forma de enriquecer um país, a ideia de "tesouros" torna-se uma obviedade.
"Piratas do Tietê", do Laerte, meus preferidos.
No contexto da política internacional, no entanto, os piratas acabaram se tornando peças importantes. O pirata, como um fora da lei, existia e povoava os mares. Contudo, havia também os corsários, aqueles piratas que tinham uma "carta de corso", ou seja, uma autorização para atuar como pirata em nome de uma coroa. No recente "Piratas do Caribe" vemos o personagem de Geoffrey Rush contando, não só com a autorização como também com o apoio financeiro e logístico da Coroa Inglesa para interceptar interesses espanhóis. Do mesmo modo, os bucaneiros franceses agiam em prol dos intereses da monarquia da França interessada em prejudicar seus "concorrentes".A pirataria entrou em declínio justamente quando as relações internacionais mudaram de figura. Com o fortalecimento dos Estados na região, promovendo mais segurança nos mares, e uma redistribruição das colônias, a pirataria vai sendo paulatinamente combatida até praticamente despararecer no século XVIII.
O que não se esperava era a volta da pirataria. Em uma entrevista de 2010 na Folha de S. Paulo, o historiador britânico Eric Hobsbawm foi perguntado sobre que eventos do século XIX foram absolutamente imprevisíveis. Entre diversas coisas que não esperava ver no novo milênio Hobsbawm citou a volta da pirataria no Oceano Índico, nas costas da Etiópia e da Somália. Por que a pirataria voltou e por qual motivo justamente ali?
A lógica é quase a mesma. Olhando no mapa veremos que aquela região é a rota que liga a Europa à Ásia pelo Canal de Suez concentrando as mais valiosas transações comerciais. Em terra, governos frágeis e muitas vezes com crises de continuidade (golpes, grupos rebeldes, etc.) e falta de Forças Armadas organizadas tornam os navios cargueiros de diversos países presas fáceis. Mas esqueçam os piratas de Stevenson, no século XXI não veremos mais barcos a vela, espadas ou papagaios. E o glamour... nem pensar.

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